terça-feira, 8 de maio de 2012

Clareira

Decidi dar um ultimo pulo na cachoeira antes de sair.
A água, dessa vez, me jorrava quente. Queimava-me em bordas pretas e estragava o banho-maria. Antes era assim?
Quando pequena, sempre passava por ali. Mesmo grande. Estava acostumada a pular de cabeça naquele poço sem fundo, redondo como ele só, capaz de engolir a luz do sol e transformá-la em frescor. Costumava entrar no mato com descaso, pés descalços, coração na mão. Se algo desse errado, era só jogar longe.
Caía em clareiras e dava em plantas grandes e formosas, novas e com seus frutos raros. Podia colher do bom e do melhor daquele mato que eu reinava. As coisas nunca tinham parecido tão simples.
Onde pisava, não me importava. Minhas solas já tinham crescido sem os sapatos, e lá ficavam, como cascas de árvore, protegendo tudo que era meu.
Tudo era meu.
Tudo era meu e, mesmo assim, nada. Porque eu, simplesmente, simples mente, não ligava. Era um cheio tão cheio, esse meu tudo de todas as coisas, que eu chamava de banal e optava pelo vazio. Talvez fosse a casca da árvore, mais uma vez, com toda a sua proteção.
Sempre seguia o mesmo caminho, o mesmo que sigo até hoje. Por ele, sei que posso ir segura. Certa vez, atravessei-o de olhos fechados, só para experimentar a sensação do escuro. Nesse ponto, sou que nem hoje: provando de tudo um pouco, sempre pulsando emoção. O "Novo".
Quando pequena, o banho era bom. Era bom no começo, no meio e no fim eu enjoava. Era tanta água, mas tanta água, que eu não aguentava mais. Engasgava, corria pra longe e sumia. Nunca me despedi da cachoeira naqueles tempos. E, se eu sumia, demorava a voltar.
Antes era assim. Não como agora.
Pulei ontem para não sair mais. Não sei o que me deu. Se a pedra que era estranha ou eu que estava diferente. O caminho que usei para chegar foi o mesmo, mas sei que não vou usá-lo para sair. Isso se eu sair daqui.
Minhas cascas de árvore racharam e viraram raízes contra meu gosto.

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